quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Indefectível Cereja

Nesta época do ano, quando ocorre a chacina dos perus poucas semanas após a chacina dos patos no Círio de Nossa Senhora de Nazaré, uma angustia muito grande toma conta das famílias que tem a sorte de poder festejar:

Com o que sirvo o assado, meu Deus?

Afoit@s respondem Arroz de Festa e Pavê !!!

Mas afoit@s deviam ser proibidos e se não conseguir resistir, faça o arroz e pergunte se o doce não é só para ver. Só prometa que no ano que vem irá frequentar algum desses grupos de ajuda mútua, mesmo com tão poucas chances de recuperação.

Como isso ocorre todos os anos, a milhares de pessoas, embora não seja propriamente Culinária de Galpão, vou compartilhar uma receita de Torta Fria, que vem sendo sucesso a mais de 30 anos, e variando alguns ingredientes, aceita aniversários, casamentos, chá de fralda, panela e frigideira (acho que é quando descasa). Depois de comprovar o sucesso, se quiser, pode dizer que a receita é sua, afinal, ninguém faz igual a ninguém mesmo.

Mas antes, uma prece para que todas as famílias que sofreram com o mar de lama em Minas e no Espírito Santo encontrem um caminho justo para refazerem suas vidas, e mesmo que a Globo e que a Vale não queiram, lutem para serem felizes novamente, porque assim lhes seguiremos, e isso também vale para todas as famílias gaúchas atingidas por alagamentos e temporais neste inverno cruel, pois se é verdade que a caridade ameniza, só a consciência das causas produz a mudança.


Resultado de imagem para natal de lama minas
Foto da Revista Época (de ter vergonha...).

Bom, vamos à receita:


Precisa de um pão de sanduíche cortado ao comprido.

Faça uma maionese com 4 gemas (eu uso apenas gemas cruas, óleo de milho, umas gotas de limão e uma pitada de sal por ovo) e depois enrole seis fatias de queijo e presunto para cortar em fatias finas.

Abra um pacote (ou vidro) de azeitonas fatiadas e escorra (prove o sal, pode ser necessário lavá-las um pouco).

No Mixer (ou pique bem fininho e depois amasse tudo junto) bata meia cebola, dois tomates pequenos, um pouco de Manjerona, uma pitada de pimenta, gotas de limão e um fio de Azeite de Oliva.

Pique sete ou oito ameixas secas sem caroço e coloque em uma frigideira com um pouquinho de margarina, depois despeje 1/3 do pote de glucose de milho (Karo ou similar) e deixe ferver em fogo baixo uns 5 minutos, mexendo sempre (se não tiver use água e um pouco de açúcar, só não use ameixa em calda).

Fios de ovos e alface para enfeitar.


No sentido horário: tomate e cebola batidos, molho de ameixa, fios de ovos, azeitonas, alface e maionese.

Pondo todas as coisas juntas: 


Inicie por uma fatia de pão recoberta com o tomate batido com cebola e temperos, isso deixa a Torta Fria molhada e mais saborosa. Cubra com menos da metade dos frios fatiados e ponha um pouco de maionese por cima.

Deite uma segunda fatia de pão e novamente recubra com o tomate e a cebola batidos, espelhe uma camada de azeitonas picadas e um pouco de maionese e reserve uma pequena parte das azeitonas.

Cubra com mais uma fatia de pão e passe em toda a superfície dela o molho de ameixas, sem deixar escorrer. Guarde um pouco do molho para o acabamento.

Acame a penúltima fatia de pão, molhe ela com o restante do tomate batido com a cebola e coloque quase todos os frios restantes, acrescente um pouco de maionese por cima.

Feche com a última fatia de pão, cubra a Torta Fria de todos os lados com uma fina camada de maionese e coloque as porções guardas dos recheios sobre ela, como se fosse um índice.

Ladeie com alface e decore com fios de ovos.

Por último e o mais importante: bem no meio, imponente, coloque a indefectível cereja e encontre um motivo secreto para isso. Eu sempre faço um desejo para aquele que tiver a sorte pega-la.   


Tudo junto indo para o refrigerador por meia hora ou mais.

Esta é uma versão para tempos bicudos, o que nunca falta são os frios e a camada de molho de ameixa, mas quando as vacas já estiveram mais gordas ousei com mais andares, com salmão defumado, fatias de lombo, camarão, tâmaras, bacalhau e até iogurte com nozes. Apenas evito frango, porque se já tem o Perú, não se deve abusar da sorte...


E o Urso  na expectativa.

Quando fazia, me ocorreu que iria bem uma camada de Queijo Cotagge. 

Fica para a próxima, talvez no Ano Novo...

 Festeje-se!




quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

- Perma o que?

- Permacultura professor!



Eu era estudante de agronomia nos anos 80 do século passado, e antes da metade do curso caiu-me nas mãos o livro Permacultura Um (editado pela Ground em 1983). Independe se foi ironia ou mazela do destino, mas em plena revolução verde, quando a agronomia era considerada a profissão do futuro, descobri que era possível pensar a agricultura de uma forma muito diferente daquela que eu tentava apreender; uma agricultura na qual a intensidade energética fosse suplantada pela biológica, houvesse ciclos mais longos que os próprios agricultores e que o instantâneo cedesse o lugar ao permanente. Uma agricultura para deixar para os netos - a que eu quero!


Capa do livro Permaculture - A Designer's Manual lembrando o Ouroboros, o ciclo eterno da vida.
Não importaram os  emes, esses, dês e pês dos professores, nada sabiam sobre a Permacultura, tão pouco conseguiam conceber uma agricultura desenhada para ser permanente e adaptada ao meio ambiente, ao invés de querer “corrigi-lo”. A bem da verdade dois se interessaram, o Raul, um judeu antigo, sábio e desastrosamente perspicaz, infelizmente já falecido, e o Darci, mais jovem, politizado e ligado no mundo - artigo raro no corpo docente Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).


Ontem e hoje.


Hoje este livro pode ser considerado um clássico, mas naquela época, em plena reinvenção democrática do Brasil, eu não tinha a menor ideia de quem eram Bill Mollison e David Holmgren, que haviam escrito o livro em 1978 com 50 e 23 anos de idade respectivamente, e muito menos imaginar a Permacultura como um movimento mundial, tal como hoje se apresenta.

Shtako! Ele nunca foi reeditado no Brasil, e  a revisão de 1979, Permaculture Two: Practical Design for Town and Country in Permanent Agriculture nem foi traduzida para o português, e no final dos anos 80, com a invenção brasileira da “Agricultura Alternativa” em oposição à Revolução Verde, a Permacultura acabou soterrada e pasteurizada, junto várias outras propostas como a Biodinâmica do Steiner,  a Agricultura Natural de Okada e a Orgânica de Howard, mas quem quiser entender mais deste período e como se organizou a arena de ideias da sustentabilidade no campo da agricultura, recomendo a produção de Jalcione Almeida, professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da UFRGS e um amigo que encontro menos que queria e devia.


Voltando para a Permacultura, apenas em 1991 houve outra publicação em português: Introdução à Permacultura por Mollinson e Reny Mya Slay (até hoje tento achar este livro), e dez anos depois, quando já havia alguma divulgação e o movimento se organizava no Brasil, um voluntário chamado Cássio P. Octaviani traduziu para o site Barking Frogs Permaculture a série de panfletos do curso de Design em Permacultura ministrado em 1981 por Mollinson, sob o nome de Introdução a Permacultura. Curiosamente, o panfleto XV - Permaculture for Milionaires não foi incluído nem na edição original americana, nem na brasileira.


Lastimo que no rol dos clássicos, o Permaculture - A Designer's Manual (1988) reste ainda sem tradução. Cheguei a tentar convencer o pessoal Núcleo de Estudos Agrários do Ministério do Desenvolvimento Agrário da importância desta publicação, mas eles estavam mais interessados em agroecologia e outros temas da área de humanas. Diferente dos livros conceituais de Holmgren: Permacultura princípios e caminhos além da sustentabilidade, editado em português em 2013, e o opúsculo Fundamentos da Permacultura, uma pérola livre para baixar pelo site do autor Holmgren Permaculture Desing vision and innovation.



Quase todo mundo que fala da Permacultura registra Mollinson e Holmgren como fundadores, o que está certo, ocorre que por ignorância ou descaso, ao falarem das raízes da Permacultura, quase sempre os comentários só abrangem aspectos pitorescos dos aborígenes australianos e dos povos ancestrais da Tasmânia donde veio Mollinson, porém há várias fontes como Smith, J. R. é pioneiro em ver árvores como uma cultura agrícola em seu Tree Crops and Permanent Agriculture de 1950, e Kropotkin, visionário do planejamento agroecológico em Fields, Factories and Workshops of Tomorow traduzido para o inglês em 1974, ambos citados no Permaculture One.


Destarte um “avô” é quase sempre esquecido, embora seja peça fundamental para compreender de onde veio tudo isso. Seu nome é Masanobu Fukuoka, agricultor e microbiologista e/ou patologista vegetal japonês, falecido em 2008, e reconhecido como fundador da Agricultura Selvagem (nas fontes internacionais é recorrente o termo Natural Agriculture, porém no Brasil pode haver confusão com a linha de Mokishi Okada, ou de Hiroshi Seó, em seu livro bem conhecido). As bases estão nos seus livros de 1975 The One-Straw Revolution e The Natural Way Of Farming - The Theory and Practice of Green Philosophy, traduzidos para o inglês em 1978 e 1985 respectivamente, e logo depois para várias outras línguas.


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Mollison e Fukuoka.

Infelizmente, sua abordagem filosófica e estética de uma agricultura em busca da perfeição humana sofreu comentaristas apressados e leitores de orelha desrespeitosos, capazes de simplificadamente dizer que se tratava de uma agricultura de “Não Fazer Nada” ponto, apenas por preconceito tocado por incapacidade, ou preguiça de alcançar a profundidade de seus princípios, para os quais não fazer é uma forma de ação.

Foi revolucionário, em plenos anos 70, quando o capitalismo acabara de invadir o campo em todo o mundo, expulsar para a pobreza milhões de agricultor@s e por toda humanidade no rumo das mudanças climáticas, propor uma agricultura para o homem e não para o mercado.

Nela era desaconselhado arar o solo, cultivar as plantações e podar as árvores frutíferas, proibido o uso de agrotóxicos, e tidos como dispensáveis o uso de máquinas, adubos e compostos. Plantar, só com um mínimo de perturbação do solo, suprimindo as plantas dispensáveis com métodos semi artesanais e intensivos.



Como não chamar de estúpidas as pessoas que confundem "não fazer" com "não interferir"?

Fukuoka, nos 50 anos dedicado a agricultura e filosofia, além de ter reflorestado vários desertos pelo mundo com suas técnicas, deu várias contribuições práticas valorosas. A mais conhecida é o resgate do encapsulamento de sementes praticado na antiguidade, que aprimorou e chamou de "Nendo Dango".

Nele as sementes são sobre semeadas nos campos dentro de pequenas bolinhas de barro, por vezes se lhes adicionando pimenta para a proteção e misturas que correspondessem aos objetivos do plantio, como a inclusão do trevo branco, por ser precoce e servir para restringir o crescimento das plantas competidoras, além de proteger o solo do excesso de sol e incorporar nitrogênio.

http://www.mendozaverdoza.com.ar/

Se houver ventura, técnicas, histórias e lendas da Permacultura e outras linhas a agricultura ecológica serão aprofundados em posts futuros, aguardem, mas se puderem, comentem já, pois será um prazer organizar a abordagem de forma iterativa.

Por fim, mas não menos importante, várias das publicações citadas estão disponíveis na internet, algumas de forma oficial, outras oficiosas e até genéricas, então se alguém precisar de algo que não encontre, pode entrar em contato por e-mail que tento ajudar.

Quase esqueci: Viva o prêmio recém concedido a Ana Primavesi ! ! ! !


Cultive-se !


sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Picadura é um perigo

É incrível como a mídia está lidando com a epidemia de Zika Vírus, parece que é problema dos outros, vende menos que escândalo e impeachment, então vai para o rodapé das notícias.

Penso que o caso é gravíssimo, e as repercussões serão de curto e longo prazo, qualquer ameaça à juventude, em qualquer País, é uma ameaça ao futuro, e assim deveria estar sendo tratada.

Lembra o caso da talidomida nos anos 50/60, quando a demora na resposta levou milhares de bebês a nascerem com malformação e sei-lá quantos morreram. Também não houve indenizações, afinal na ditadura isso era azar, e quem prescreveu e quem produzia não deviam nada.

Neste link há muitas explicações que o Ministério da Saúde está se esforçando para divulgar:


A leitura delas é interessante, porque se vê que quase nada está sendo veiculado pela nossa imprensa, dita imparcial, talvez porque, como se poder observar no mapa abaixo, os mais de  1.700 casos registrados até dezembro estão distribuídos em 422 municípios que são na maioria muito pobres.


Possivelmente a cobertura da imprensa correrá similar à cobertura da AIDS, sem informação e muita desinformação. Será que novamente vamos ter que aguardar milhares de mortes e ver o preconceito se espalhar até que surjam famosos, brancos e ricos, não necessariamente nesta  mesma ordem, infectados para as concessionárias de Tv e Rádio comessem, de fato, a cobrir esta epidemia e divulgar informações valiosas?  É temerário e sintomático o descaso em combater os boatos estúpidos que estão surgindo, como o Zika Vírus vem de vacinas, ataca idosos e crianças e não é transmitido pelo mosquito da Denge.

O bom é que a sociedade está mais atenta e mobilizada desta vez, e á reações valorosas e do bem como a foi produzida pelo esforço dos bombeiros de Mogi Mirim que serve para todo mundo, mesmo para quem ainda não está ainda sob ameaça:



Quando morava no Amapá, por vezes nos trabalhos pelo interior, principalmente em deslocamentos longos de barco, a mosquitama e o calor eram tamanhos naqueles rios e igarapés, que rápido terminava o estoque de repelente e a solução era fazer como os caboclos que pescavam de noite: passar óleo dísel. É algo que não recomendo, mas o desespero era grande, então, melhor seguir as indicações do parceiro ai de cima ou a:

Dica do Pastor Alemão:

Bem mais elegante, aprendida de um francês mateiro que era quase um amapaense e chama-se Jean du Bois, especialista internacional em sistemas agroflorestais: usar perfumes a base de Capim Vetiver. Naquela época do século passado, em plena Amazônia do fim dos anos 90, só na Top Internacional se achava perfumes assim, e de vez em quando, mas hoje é bem fácil.

Como detesto repelentes industriais, e creio que as crianças não devem sofrê-los (leiam a bula), vez ou outra compro óleo essencial de Capim Vetiver no mercado livre, custa perto de R$ 50,00, e bato no mixer junto com algum creme hidratante bem pastoso, cuidando para não ficar aguado demais. Eis um belo repelente, com um odor bem melhor que óleo dísel e mais persistente. Quem quiser também misturar ele com protetor solar. Só recomendo cuidado na harmonização dos odores, porque misturar odores muito diferentes pode acabar na famosa essência Mijolet de Gatôm.

Sim, para não deixar os sitiantes acidentais sem nada neste post, olhem este site:

Capim Vetiver em Recuperação Ambiental

O Capim Vetiver é explicado, e proposto para recuperação de áreas degradadas e tratamento de efluentes. Genial, vou atrás de mudas! Aguardem novas informações.

´Raízes do Capim Vetiver, donde se extrai a essência.

Perfume-se!

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Pelar Porco com Foguete




Quando tinha mais ou menos 17 anos, já passava quase todas minhas férias na Borrússia, e um mundo rural, rústico e surpreendente, lançava contrastes sobre mim que se apegavam nas coisas que eu mais gostava, lhes transformando em uma dialética estranha. Em poucos anos, creio, aquilo que realmente me movia estava impregnado dessa elaboração particular do rural, que não negava a vida urbana, mas a encaixava como podia, hora subordinando-a, hora sendo suplantada em mutua invasão.

Mas o que porcos e foguetes fazem nesse enredo?


De todas as místicas rurais daquela época, creio que "O dia de matar porco" era das mais intensas, um um evento planejando dias antes, quando o animal tinha o destino selado e era posto para "limpar", numa espécie de corredor ma morte. Cometido o "assassuinato", como um amigo chamava, a primeira tarefa era a pela artesanal derramando água fervendo sobre o corpo do animal e raspando os pelos com facas (tem quem ponha fogo...), depois, simplificando as etapas, as carnes eram separadas, os miúdos fervidos e moídos para fazer morcilha e o torresmo prensado para fazer a banha. No final, estávamos exaustos, cheios de pequenas queimaduras e cortes, enfumaçados - intoxicados na verdade - e muito contentes.

Então era necessário muita lenha para ferver a água em um caldeirão de ferro, de 60 ou mais litros reabastecido seguidamente, que ficava improvisadamente meio pendurado, meio apoiado, em três pedras grandes (suspeito que por isso os caldeirões têm três pés) sobre uma fogueira forte acesa por quase 5 horas.

Este tipo de fogueira, comum em todos os locais do mundo desde o tempo das cavernas, só não é a forma mais ineficiente de aproveitar a energia da queima da madeira, porque há a possibilidade de fazê-la em aberto, sem proteção alguma. Eis um problema para a humanidade, pois combustíveis renováveis dependem de uso sustentado e em diversos locais do mundo, onde só se cozinha com lenha ou carvão, estes combustíveis estão cada vez mais raros, causando outras complicações além das ambientais, como por exemplo onde há paz, as pessoas gastarem muito tempo produtivo catando lenha, e onde há guerra, buscar lenha de locais ermos e afastados é um perigo extremo. Além disso, o fogo dentro das casas causa contaminação do ar doméstico, afligindo especialmente as mulheres que cozinham em meio a fumaça, além do risco acidentes com crianças e pouca higiene.

Fogões e lareiras de fogo aberto são os principais meios de cozimento e aquecimento para quase três bilhões de pessoa, na Índia, cerca de 400.000 pessoas morrem a cada ano  por causas ligadas à fumaça, e na África, 500.000 crianças menores de cinco anos morrem de pneumonia atribuível à poluição do ar interior, segundo a OMS.
<http://misfitsarchitecture.com/tag/rocket-stove/>
Por estas razões os sitiantes acidentais ou não, deveriam pensar seriamente em adotar os fogões foguetes nas suas casas como uma solução sustentável e do bem, não só para a lida da matança do porco (muito menos lenha, muito menos esforço e mais muito mais segurança e saúde), mas para várias outras necessidades da vida, como cozinhar e assar pães no dia dia, aquecer a casa, retirar o excesso de umidade prejudicial para a saúde, ou secar grãos, frutas e tabaco (ainda vou testar num alambique). Aqui na Borrússia, o protótipo ficou tão bom que está em uso a mais de três anos, hora fazendo toneladas de comida para os cachorros, hora esquentando um disco para fazer maravilhosos chuletões e pernis fatiados, além de outras coisas menos prosaicas, como derreter piche.


Muito básico, barato, seguro e funcional.

Ninguém deve queimar mais lenha do que precisa, nem respirar fumaça, e foi, possivelmente, pensando em algo assim, que Larry Winiarski, um Engenheiro Mecânico com Ph.D., desenvolveu em 1982 os princípios do que seria o Fogão Foguete, ou "Rocket Stove", como é mundialmente conhecido. Ele continua pesquisando e difundindo a queima limpa e eficiente de combustíveis renováveis no Centro de Pesquisas Aprovecho, seu rancho no Estado Americano do Oregon (Aprovecho.org), e sinceramente espero que um dia tenha o reconhecimento merecido por seu exemplo de se preocupar, antes, em mudar o mundo, do que buscar registros, direitos e patentes, coisa que Alfred Nobel, o inventor da dinamite e do prêmio de mesmo nome, só fez depois de muito rico e muito velho, quando decidiu ter remorso.

Dr. Larry Winiarski
<http://misfitsarchitecture.com/tag/rocket-stove/>
Hoje há uma infinidade de usos e variantes dos princípios originais de desenvolvimento do "Rocket Stove", mas eles permanecem inalterados: eficiência na combustão por queima dupla da madeira e da fumaça. Algo que Winiarski só consegui com a ideia genial de por o fogo dentro da chaminé!

Nela o ar entra com mais força e se aquece rapidamente, em turbilhão, ao passar por dento do fogo, faz a temperatura do sistema se elevar, e com a ajuda de algum isolante térmico, o local da combustão pode alcançar temperaturas entorno de 1.000°C que na saída ultrapassam 500 °C. O suficiente para queimar o carbono da madeira e provocar uma segunda queima dos extratos orgânicos volatilizados que produzem a fumaça e são extremamente tóxicos, desta forma se obtém até 40% a mais de calor com a mesma quantidade de madeira e quase não há emissão de gases além de CO2.

Parece complicado, mas é muito simples na verdade e ao redor do mundo há muitas pessoas desenvolvendo projetos humanitários para a distribuição destes fogões ou de outros tipos, mas com queima eficiente, usando os mais diversos materiais, formas e aplicações (Improved Biomass Cooking Stoves), assim como há uma multidão de donos e donas de quintal se aventurando em projetos DIY (Do It Yourself), campistas e desesperados como os da foto ai de baixo...

O conhecimento é portátil! Rocket Stove imporvisado matando a fome da gente na obra. 

Como se tratam de princípios e não de um modelo, existe uma infinidade de projetos e materiais possíveis. Há fogões foguete de barro, tijolo, aço, há fornos adaptados, há desidratadores de frutas, modelos de secadores de grãos de leito fixo, aquecedores de água, aquecedores de ambiente, fogões domésticos de chapa de ferro, saunas, modelos imensos e portáteis, enfim, centenas de paginas na internet, infelizmente repletas de Crtl+C e Crt+V sem fontes nem valor. Então pode parecer complexo, mas atendo-se aos princípios e algumas regras práticas é fácil desenvolver um modelo funcional, e sempre que houver uma dúvida vá para a origem: Aprovecho Research Center - Desing .

Diretrizes:


  1. Use material resistente na câmara de combustão (tijolos refratários ou peças de ferro grosso), para garantir a combustão em temperatura elevada e durabilidade.
  2. Adicione isolante externo na câmara e na chaminé (cinzas peneiradas são uma ótima opção).
  3. Use uma grelha dentro do fogão para afastar a lenha em combustão do fundo, assim o ar virá por baixo e entrará aquecido e em quantidade suficiente na câmara de combustão.
  4. Preste atenção para as proporções:
  • a área da seção de entrada (A) deve ser igual a de saída.
  • o comprimento deve ser pelo menos 2 X a altura (ou diâmetro) da entrada.
  • a altura da base até o topo deve ser 3 X a altura (ou diâmetro), ou no mínimo 2,5 X mais 5 cm.
  • a grelha deve ficar 1/3 da altura (ou diâmetro) de entrada.
  • a panela deve ficar elevada na saída (metade da altura da grelha).
  • abas envolvendo a panela ajudam na eficiência, mas a distância deve permitir boa exaustão (no mínimo a metade da seção da saída).

http://www.setelombas.com.br/

Queime-se.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Quem tem, tem medo!

Também, mas vamos falar mesmo é de pets, que aqui na Borrússia são mais conhecidos como cães e gatos. É que na urbe, a infestação por pulgas, carrapatos, piolhos e ácaros nos animais de estimação é mais um problema de etiqueta social, que de vida ou morte, porém no campo, o bagulho é islâmico e quem tem, tem medo.

De qualquer forma, mesmo para os bichos urbanos, este post pode ser interessante, principalmente para quem não pode pagar banho e tosa toda hora (mais ou menos o custo de escova e luzes), pois pode levar a uma economia razoável de cérebro, rins e fígado para eles, e de dinheiro para seus donos, mas há "tradeoffs".

Quem banha o gado, e com a sobra banha os cães e gatos, não precisa ler o post, porque loucura não passa: as "trinas" (cipermetrina, deltametrina...) são piretróides que fazem um mal danado para os rins e figados deles, apenas nas concentrações muito baixas são permitidas pelo MAPA, já os Ós (diclorvós, clorpirifós) são organofosforados, que não matam só os insetos, mas também os agricultores que os aplicam fumando e vestindo calção e chinelo de dedo, pois acabam com o sistema nervoso, por fim, mas sem esgotar, há os Az (armitraz), grupo das formamidinas, que se o animal for velho, logo cardiopata e diabético, é o caminho do céu.

Bom, como a imensa maioria das pessoas deve ser normal, é de se esperar que os bichos sejam mesmo é lavados e esfregados com sabão e shampoos fedorentos, e depois lhes apliquem aquelas ampolinhas plásticas esquisitas, que vêm em "blisters" com nomes interessantes e muito coloridos.

São ótimas, o problema é que custam R$ 80,00, ou mais, e o efeito dura de 30 a 40 dias. Por motivos óbvios não vou citar os nomes comerciais, mas as melhores são as mais caras, pelas quais os vendedores sempre iniciam, só depois, se não cola, vão descendo até opções de R$ 50,00, que são boas para apartamento, onde não se precisa repetir muito cedo, pois normalmente são piretróides.

Estes produtos, embora alguns aleguem não ser, são veneno sim(!), porém, os fabricantes sustentam - e o governo topa - que nos testes científicos os efeitos nos mamíferos, se comparados com os produtos listados antes, foram mais leves, mas tudo é a mesma coisa: envenenar um para matar os outros.

Onde pega é no uso indiscriminado do agronegócio, que para economizar e maximizar lucro, brigam pelo "direito" de aplicá-los em doses maiores sobre todos e em tudo que é lugar, e acreditem: até de avião - algo que deveria ser proibido em qualquer hipótese. O MAPA só começou a limitar esse absurdo porque as colmeias foram dizimadas em vários locais da Europa e dos USA.

O Urso, achando que era injeção!
Mas voltando para a escala doméstica, abre-se uma oportunidade que quero compartilhar aqui, sem matar abelhas: nas bisnaguinhas um mililitro é caríssimo, mas se olharmos para a linha de carrapaticidas da pecuária, há os mesmos princípios ativos em frascos de litro ou mais, praticamente pelo mesmo preço de uma dose para um cão de até 10 Kg.

Às contas: as bisnaguinhas duram, nos bichos de apartamento, uns dois ou três meses, se não derem banho depois da aplicação. Quando o bichano passeia à noite, ou o cãozinho vai na praça, principalmente nos meses quentes (novembro em diante), quando há uma explosão de pulgas e carrapatos (calor mais umidade), dificilmente não vai ser preciso uma ou duas doses a mais. Então, por baixo, umas três aplicações devem ser a média anual, algo que para o bicho é suave, mas para o dono não, são pelo menos R$ 240,00 por ano/cabeça para bichos protegidos.

Indo embora, com o lombo tingido.
Já um litro de um carrapaticida de aplicar no lombo da criação (Pour-On) custa perto de R$ 100,00 reais, procurando bem, haverá vários de piretróides, e uns poucos de Fipronil ou de Invermectina. Acho que o Fipronil é mais eficaz, e um dos mais famosos  "Pour-on" de 1 litro tem quase os mesmos nome e preço do "blister" de 1 ml.

Então, basta comprar o litrão e tacar no lombo?

Calma, falei antes que tinha um pequeno "trade off", na verdade dois.

As empresas sabem disso, então, se o bicho não for preto, ou marrom escuro, vai ficar meio pintado. A justificativa oficial é evitar que um animal receba duas doses por engano, mas sabemos que vender a R$ 70.000,00 o litro tem uma baita diferença de vender a R$ 100,00 o litro da mesma coisa. Uma parte pequena dessa diferença, a bem da verdade, é o governo sacaneando, pois trata os animais domésticos como supérfluos e morde forte nos impostos.

Segundo, que o boi é bem mais pesado, então a quantidade aplicada é maior, deve ser mais diluída e cobrir todo o lombo, para ser absorvida em vários locais e se distribuir com mais segurança, assim o litrão tem o Fipronil menos concentrado (1% normalmente) que as bisnaguinhas (10% na média). Para resolver isso o pastor alemão faria as contas com vírgula, já o sitiante acidental, ora escrevendo, aumenta um poco a dose e acredita que a margem de segurança é suficientemente alta para não matar nenhum cusco, mas é você decide.

A Preta, que adora qualquer função.
Grosso modo, uma bisnaguinha tem quase 0,7 mg de Fipronil e basta para tratar um animal com 10 kg de peso vivo, logo 7 ml do litrão darão a mesma dose de princípio ativo.

Na internet tem quem desaconselhe usar estes produtos Pour-On, mas só achei argumentos medíocres (menos um: o cão pode se lamber, pois a aplicação é no lombo todo, então cuidado para não escorrer dos lados), e assim sigo aplicando na cachorrada: pequenos, tipo linguiça, 10 ml; médios, tipo dálmata, 20 ml, grandes, tipo labrador, 30 ml. Se for monstro, tente calcular o peso, pois um dog alemão é mais alto, mas bem mais leve que um fila.

Nem se nota.
Na humildade, quem tem um cachorro ou um gato, e não é muquirana demais, aguenta nas ampolinhas (as mais caras possuem um hormônio que impede o desenvolvimento das larvas das pulgas, que para bichos de apartamento mantido limpo é uma inutilidade).

Aqui na Borrússia temos cinco feras, e o ambiente é muito agressivo, então, somando tudo, dá mais de 100 kg só de cachorro (o gato sumiu). A última aplicação foi de 110 ml (1 pequeno, 2 médios e 2 grandes), e como no calor é quase certa a repetição em 60 dias mais ou menos (no inverno uma basta), por ano, se deve usar quase meio litro.  Isso não chega a R$ 50,00, porém se fossem bisnaguinhas, seriam 11 ml por aplicação, e mesmo ligando o "f...-se" no inverno, dificilmente custaria menos que R$ 700,00 por ano, além da cachorrada ainda ia pegar algum berne e carrapato - pulga aqui é bobagem...

Um alerta final, muito importante.

Na hipótese do prezado internauta ver os cães e gatos como alimento, independente de aplicar bisnaguinha ou litrão, aguarde os 100 dias regulamentares entre a aplicação e o banquete, mas sugiro mudar sua cultura e deixar os bichos em paz, afinal há opções melhores: a carne ovina é uma delícia e harmoniza com Malbec (pets eu nunca vi um sommelier sugerir alguma harmonização).

Cuide-se!

sábado, 28 de novembro de 2015

Culinária de Galpão

O galpão sempre participou da mitologia gauchesca, seja pela via do gauchismo fundado por Cezimbra Jacques em 1889, que não ia muito além de bailes e pilchas, ou do regionalismo nascido por volta de 1920, a partir da obra de Alcides Maya, especialmente o "Lendas do Sul" de 1922, ou do tradicionalismo, lançado em 1947 quando, segundo contam outras lendas, Paixão Cortes enlouquecera com um dono de bar em Porto Alegre que usava a bandeira do Rio Grande para tapar a janela, sem saber o que ela era, ou finalmente, do nativismo, iniciado nos anos 70, quando sessenta visionários foram a platéia da primeira Califórnia da Canção em 1971.

Recentemente o galpão vem se consubstanciando na previsão apocalíptica de Barbosa Lessa sobre o nascimento do “barulhismo”, já que inventaram o Rock de Galpão, embora destes eu seja um fã ( http://rockdegalpao.com.br/blog/ ).




Reportando esse turbilhão para a culinária gaúcha, imagino o debate interminável.

Tome o Arroz de Carreteiro: um gauchista possivelmente só o comeria pilchado, entre uma dança e outra, e creio que não lhe importaria muito o ketchup, um regionalista exigiria que o prato tivesse arroz cateto de Uruguaiana, charque pelotense e cebola de São José do Norte, já o tradicionalista ia querer que a receita seguisse alguma norma do MTG, e o nativista ia fazer pouco da norma, mas ia querer igualzinho.

Então, porque não lançar a Culinária de Galpão, seguindo o Barulhismo, para apreciar pilchado e de prenda, ou não, usar produtos regionais ou não, e seguir as normas do MTG ou não, mas sem esquecer da Manjerona e de cozinhar com a alma gaúcha.

Para inaugurar, uma receita propositalmente de um prato que não é gaúcho, mas que devia ser!

Ela é italiana, de raíz, e achei no site do açougueiro e showman  Dario Cecchini ( http://www.dariocecchini.com/en/ ), entre maravilhosas Bisteccas Alla Fiorentina - outra receita que não ia fazer mal algum a gente ter uma variação na nossa tradição.

Quando a vi, não conseguia imaginar como ela não nos pertencia e representava, uma falha que pretendo corrigir tradicionalizando-a com a ajuda de vocês. Não é trabalhosa, mas é demorada, então galpão à obra.


Brasato al Midollo
"E’ muscolo di coscia di manzo con sale pepe ramerino e midollo.
Si cuoce in forno incoperchiato  per 3 ore a 180° con un chilo di scalogni pelati e mezzo bicchiere di olio buono.

Niente sale.
Dopo 2 ore circa si può aggiungere mezzo bicchiere di vinsanto.
A fine cottura si lascia riposare mezzora sempre coperto.
Da leccarsi i baffi.
D.C."

Dario Cecchini's brasato al midollo
Foto emprestada do Financial Times.

Ingredientes (6 pessoas): 2,5 kg de músculo, cortado em uma única peça, um ossobuco cortado verticalmente, sal e pimenta, um raminho de alecrim fresco picado, 1/2 xícara de azeite, 500 g de cebolas pequenas, descascadas e picados, 200 ml vinho Santo.
  1. Preaqueça o forno a 180C.
  2. Abra o músculo, salpique pimenta e sal. Disponha a medula como recheio e sobre ela um pouco de alecrim fresco. Feche com barbante de cozinha, e colocar um pouco de alecrim por cima.
  3. Coloque no forno por 3 horas, em uma caçarola grande com a tampa fechada, junto com as cebolas descascadas e a metade do azeite. Não ponha sal por fora.
  4. Quando passar 2 horas de forno, adicione meio copo de vinho Santo na caçarola e deixe-a tampada a hora restante em forno baixo (150°), mas confira de vez em quando para que a carne não seque, colocando o molho sobre ela. Só adicione água só se for preciso, o molho deve ficar grosso.
  5. Quando cozido, deixe repousar meia hora coberto no forno aberto.
  6. Para servir tire os barbantes, peneire as cebolas e use o molho para enfeitar o prato.
  7. Acompanhe com pão.


Dicas:


  • Para "tradicionalizar" use Manjerona em vez do alecrim, ou os dois, mas seja suave.
  • O Vinho Santo é difícil de encontrar, use Malvasia. Na falta, pode ser simplesmente um branco suave, mas nunca usei vinho de Niágara e não aconselho nem secos, nem tintos.
  • Os açougueiros nunca entendem o que se quer, tem que ter paciência. Peça para desossar o músculo ao comprido, cortando uma vez no sentido dos feixes musculares e descolando do osso, é fácil, mas quase ninguém quer assim.
  • Para tirar a medula do osso (tíbia), tem que ser serrado nas pontas e depois ao comprido, bem no meio. 
  • Na receita original só vai sal por dentro da carne, fiz assim uma vez e achei gostoso, mas muito diferente o gosto. Quem quiser que ouse, eu prefiro por uma pitada de sal grosso amassada com a Manjerona e a pimenta por fora e deixar pegar gosto uns 20 minutos antes de arrumar na caçarola.
  • Quando servir e decida se vai deixar o mais inteiro possível, ou desfiar um pouco para comer no pão, pegando com a mão, no melhor estilo da "cozinha ogra".
  • Guarneça com dois ou três tipos de pão, indispensável só o italiano.
  • Se não consegue comer sem salada, Agrião e Radiche (Almeirão) funcionam super bem.
  • Vinho, testei com Merlot, Tanat e Malbec, esse último, definitivamente, mas cerveja não caiu mal.
  • Melhor no frio.


Quando fizer o prato, mande fotos e sugestões, e vamos tudo publicar aqui!

Cozinhe-se! 

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Storytelling

Pondo Todas as Coisas Junto

A turma do marketing de conteúdo enche páginas e mais posts, para convencer que o marketing do século passado foi enterrado pela web 2.0. Agora os mantras deram lugar ao diálogo e as emoções na iteração e todos convergem na importância do "storytelling" para transformar pessoas em "leads". Neste diapasão, vou contar uma estória no princípio do blog ligada ao seu propósito.


Em 1974, minha mãe decidiu investir (em algo que não acabava) o dinheiro que conseguira arrancar da briga judicial dura com os ex-sócios do meu pai. Segundo ela, "terra é para sempre", e foi assim que eu, com 9 anos, acabei no banco de trás de uma Variant vermelha procurando sítios a venda no município de Osório, onde a parte italiana de nossa família tinha raízes. Lembro, nesses dias ter visitado a casa do Tio Mário, como ela o chamava (hoje nome de rua), e anos depois, das deliciosas conversas com seu filho Neneco, que me falou da amazônia pela primeira vez entre cafezinhos na Padaria Central.

Olhamos uns dois ou três, até que alguém sugeriu que subíssemos a estrada do morro. Só lembro que depois de subir muito por uma estrada de terra, chegamos em um povoado pequeno, onde minha mãe, no final de uma tarde de sol, fez um senhor barbudo e aloirado parar a carroça, para lhe perguntar, pela janela do carro, que local era aquele?

- É a "Borússia" dona.

Mapa histórico da colonização da Borrússia, ocorrida, possivelmente, nos anos 40.  


Não sei o quanto, mas foi pouco tempo depois, seu Manoelão vendeu para ela o sítio onde criara gado de leite por alguns anos. Numa ponta havia os restos de uma antiga olaria, na outra o cume do morro Pelado. Não havia porteiras, só cancelas, uma tapera, uma casa velha e algumas cercas. A imissão na posse - como se diz no Incra - acho que foi numa tarde chuvosa, quando meu irmão, minha mãe e eu fizemos um churrasco improvisado na tapera, que depois acostumamos a chamar de Casa do Chico. 

Voltaremos neste tempo quando for necessário, importa é saber que nossas vidas acabaram se ligando a este local de diversas maneiras, e ora como benção, ora como maldição, ele nos foi esculpindo o futuro.

Não sei o porquê, mas a força dele em mim foi determinante; da adolescência até a juventude preferi férias no mato em vez da praia, depois  a agronomia em vez da filosofia; até que fugi, virei agroburocrata, fui morar na Amazônia, em Brasília, e "mais" depois, velho (ou quase), me acordo de repente morando na Borrússia.

Motivos pessoais, maldição, vontade secreta, pouco importa. Vou reler 100 Anos de Solidão para ver se me dá alguma luz. Ocorre que, por ora, posso me considerar agroburocrata, sitiante acidental e (meio) alemão que insiste em pastorear ovelhas.

Como depois dos 50 a reinvenção da pessoa deixa de ser uma opção, resta a abordagem radical: por todas as coisas juntas e cotejar clareza e mistério, para enfrentar a esfinge. 

Eis um propósito! Um blog para não ser devorado.

Comunidade da Santa Rita, Borrússia, Morro Osório, Osório/RS.

Proponho que conversemos sobre a vida na Borrússia e a busca pela simplicidade, pela autossuficiência e pela sustentabilidade que ela implica. 

Nisso haverá desafios insuperáveis para um agroburocrata, então será o sitiante acidental quem terá que convidar vocês para a prosa. Pautaremos o pastoreio racional Voisin, a viticultura, a permacultura, a ovinocultura, a aquaponia, a bioconstrução, a reciclagem,  as energias renováveis, o turismo sustentável e hospitalidade, e mais o que ocorrer - como diziam no Amapá. Ajudem!

Então, quando algo tiver que ser posto em prática, será a vez do pastor alemão aproveitar para trocar experiências sobre tudo que implique nos seus ofícios: pastor, artesão, marceneiro, construtor de fogões de queima eficiente, planejador de piscinas naturais, construções com terra, mini-cabanas, ferrocimento, telhados verdes, reciclagem de pallets, materiais alternativos, trilhas, fornos de barro e tandor. 

É inesgotável, vamos nos divertir muito tentando mudar o mundo!


Eu, uma roda reciclada, biochar , cerveja, costela e salsichão da Borrússia.
Agroburocrata, sitiante acidental ou pastor alemão?
Publique-se!

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Sitiante Acidental

Atenção!

O Pastor Alemão é um blog sobre a vida e pouco se falará da raça canina, menos ainda de assuntos religiosos.

Digo agora, para não repetir depois,  o nome do Blog se deve à condição humana do autor: com metade da origem familiar alemã é pastor de ovelhas na Borrússia, além de sitiante acidental e agroburocrata. 

Ao por todas as coisas junto, o conteúdo dos próximos posts abordará temas variados, mas não desconexos, com o propósito de compartilhar experiências, na esperança de que outro mundo seja possível; desejado justo, sustentável e absolutamente compartilhado por tod@s com equidade. 

E se der, também apre(e)nder com as contribuições, críticas e descobertas que venham de vocês, ai do outro lado dos clicks.

Por sinal, não deixe de comentar, curtir e compartilhar se for gostando, só para ver onde essa coisa toda vai chegar.


      

Blogue-se!