sábado, 28 de novembro de 2015

Culinária de Galpão

O galpão sempre participou da mitologia gauchesca, seja pela via do gauchismo fundado por Cezimbra Jacques em 1889, que não ia muito além de bailes e pilchas, ou do regionalismo nascido por volta de 1920, a partir da obra de Alcides Maya, especialmente o "Lendas do Sul" de 1922, ou do tradicionalismo, lançado em 1947 quando, segundo contam outras lendas, Paixão Cortes enlouquecera com um dono de bar em Porto Alegre que usava a bandeira do Rio Grande para tapar a janela, sem saber o que ela era, ou finalmente, do nativismo, iniciado nos anos 70, quando sessenta visionários foram a platéia da primeira Califórnia da Canção em 1971.

Recentemente o galpão vem se consubstanciando na previsão apocalíptica de Barbosa Lessa sobre o nascimento do “barulhismo”, já que inventaram o Rock de Galpão, embora destes eu seja um fã ( http://rockdegalpao.com.br/blog/ ).




Reportando esse turbilhão para a culinária gaúcha, imagino o debate interminável.

Tome o Arroz de Carreteiro: um gauchista possivelmente só o comeria pilchado, entre uma dança e outra, e creio que não lhe importaria muito o ketchup, um regionalista exigiria que o prato tivesse arroz cateto de Uruguaiana, charque pelotense e cebola de São José do Norte, já o tradicionalista ia querer que a receita seguisse alguma norma do MTG, e o nativista ia fazer pouco da norma, mas ia querer igualzinho.

Então, porque não lançar a Culinária de Galpão, seguindo o Barulhismo, para apreciar pilchado e de prenda, ou não, usar produtos regionais ou não, e seguir as normas do MTG ou não, mas sem esquecer da Manjerona e de cozinhar com a alma gaúcha.

Para inaugurar, uma receita propositalmente de um prato que não é gaúcho, mas que devia ser!

Ela é italiana, de raíz, e achei no site do açougueiro e showman  Dario Cecchini ( http://www.dariocecchini.com/en/ ), entre maravilhosas Bisteccas Alla Fiorentina - outra receita que não ia fazer mal algum a gente ter uma variação na nossa tradição.

Quando a vi, não conseguia imaginar como ela não nos pertencia e representava, uma falha que pretendo corrigir tradicionalizando-a com a ajuda de vocês. Não é trabalhosa, mas é demorada, então galpão à obra.


Brasato al Midollo
"E’ muscolo di coscia di manzo con sale pepe ramerino e midollo.
Si cuoce in forno incoperchiato  per 3 ore a 180° con un chilo di scalogni pelati e mezzo bicchiere di olio buono.

Niente sale.
Dopo 2 ore circa si può aggiungere mezzo bicchiere di vinsanto.
A fine cottura si lascia riposare mezzora sempre coperto.
Da leccarsi i baffi.
D.C."

Dario Cecchini's brasato al midollo
Foto emprestada do Financial Times.

Ingredientes (6 pessoas): 2,5 kg de músculo, cortado em uma única peça, um ossobuco cortado verticalmente, sal e pimenta, um raminho de alecrim fresco picado, 1/2 xícara de azeite, 500 g de cebolas pequenas, descascadas e picados, 200 ml vinho Santo.
  1. Preaqueça o forno a 180C.
  2. Abra o músculo, salpique pimenta e sal. Disponha a medula como recheio e sobre ela um pouco de alecrim fresco. Feche com barbante de cozinha, e colocar um pouco de alecrim por cima.
  3. Coloque no forno por 3 horas, em uma caçarola grande com a tampa fechada, junto com as cebolas descascadas e a metade do azeite. Não ponha sal por fora.
  4. Quando passar 2 horas de forno, adicione meio copo de vinho Santo na caçarola e deixe-a tampada a hora restante em forno baixo (150°), mas confira de vez em quando para que a carne não seque, colocando o molho sobre ela. Só adicione água só se for preciso, o molho deve ficar grosso.
  5. Quando cozido, deixe repousar meia hora coberto no forno aberto.
  6. Para servir tire os barbantes, peneire as cebolas e use o molho para enfeitar o prato.
  7. Acompanhe com pão.


Dicas:


  • Para "tradicionalizar" use Manjerona em vez do alecrim, ou os dois, mas seja suave.
  • O Vinho Santo é difícil de encontrar, use Malvasia. Na falta, pode ser simplesmente um branco suave, mas nunca usei vinho de Niágara e não aconselho nem secos, nem tintos.
  • Os açougueiros nunca entendem o que se quer, tem que ter paciência. Peça para desossar o músculo ao comprido, cortando uma vez no sentido dos feixes musculares e descolando do osso, é fácil, mas quase ninguém quer assim.
  • Para tirar a medula do osso (tíbia), tem que ser serrado nas pontas e depois ao comprido, bem no meio. 
  • Na receita original só vai sal por dentro da carne, fiz assim uma vez e achei gostoso, mas muito diferente o gosto. Quem quiser que ouse, eu prefiro por uma pitada de sal grosso amassada com a Manjerona e a pimenta por fora e deixar pegar gosto uns 20 minutos antes de arrumar na caçarola.
  • Quando servir e decida se vai deixar o mais inteiro possível, ou desfiar um pouco para comer no pão, pegando com a mão, no melhor estilo da "cozinha ogra".
  • Guarneça com dois ou três tipos de pão, indispensável só o italiano.
  • Se não consegue comer sem salada, Agrião e Radiche (Almeirão) funcionam super bem.
  • Vinho, testei com Merlot, Tanat e Malbec, esse último, definitivamente, mas cerveja não caiu mal.
  • Melhor no frio.


Quando fizer o prato, mande fotos e sugestões, e vamos tudo publicar aqui!

Cozinhe-se! 

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Storytelling

Pondo Todas as Coisas Junto

A turma do marketing de conteúdo enche páginas e mais posts, para convencer que o marketing do século passado foi enterrado pela web 2.0. Agora os mantras deram lugar ao diálogo e as emoções na iteração e todos convergem na importância do "storytelling" para transformar pessoas em "leads". Neste diapasão, vou contar uma estória no princípio do blog ligada ao seu propósito.


Em 1974, minha mãe decidiu investir (em algo que não acabava) o dinheiro que conseguira arrancar da briga judicial dura com os ex-sócios do meu pai. Segundo ela, "terra é para sempre", e foi assim que eu, com 9 anos, acabei no banco de trás de uma Variant vermelha procurando sítios a venda no município de Osório, onde a parte italiana de nossa família tinha raízes. Lembro, nesses dias ter visitado a casa do Tio Mário, como ela o chamava (hoje nome de rua), e anos depois, das deliciosas conversas com seu filho Neneco, que me falou da amazônia pela primeira vez entre cafezinhos na Padaria Central.

Olhamos uns dois ou três, até que alguém sugeriu que subíssemos a estrada do morro. Só lembro que depois de subir muito por uma estrada de terra, chegamos em um povoado pequeno, onde minha mãe, no final de uma tarde de sol, fez um senhor barbudo e aloirado parar a carroça, para lhe perguntar, pela janela do carro, que local era aquele?

- É a "Borússia" dona.

Mapa histórico da colonização da Borrússia, ocorrida, possivelmente, nos anos 40.  


Não sei o quanto, mas foi pouco tempo depois, seu Manoelão vendeu para ela o sítio onde criara gado de leite por alguns anos. Numa ponta havia os restos de uma antiga olaria, na outra o cume do morro Pelado. Não havia porteiras, só cancelas, uma tapera, uma casa velha e algumas cercas. A imissão na posse - como se diz no Incra - acho que foi numa tarde chuvosa, quando meu irmão, minha mãe e eu fizemos um churrasco improvisado na tapera, que depois acostumamos a chamar de Casa do Chico. 

Voltaremos neste tempo quando for necessário, importa é saber que nossas vidas acabaram se ligando a este local de diversas maneiras, e ora como benção, ora como maldição, ele nos foi esculpindo o futuro.

Não sei o porquê, mas a força dele em mim foi determinante; da adolescência até a juventude preferi férias no mato em vez da praia, depois  a agronomia em vez da filosofia; até que fugi, virei agroburocrata, fui morar na Amazônia, em Brasília, e "mais" depois, velho (ou quase), me acordo de repente morando na Borrússia.

Motivos pessoais, maldição, vontade secreta, pouco importa. Vou reler 100 Anos de Solidão para ver se me dá alguma luz. Ocorre que, por ora, posso me considerar agroburocrata, sitiante acidental e (meio) alemão que insiste em pastorear ovelhas.

Como depois dos 50 a reinvenção da pessoa deixa de ser uma opção, resta a abordagem radical: por todas as coisas juntas e cotejar clareza e mistério, para enfrentar a esfinge. 

Eis um propósito! Um blog para não ser devorado.

Comunidade da Santa Rita, Borrússia, Morro Osório, Osório/RS.

Proponho que conversemos sobre a vida na Borrússia e a busca pela simplicidade, pela autossuficiência e pela sustentabilidade que ela implica. 

Nisso haverá desafios insuperáveis para um agroburocrata, então será o sitiante acidental quem terá que convidar vocês para a prosa. Pautaremos o pastoreio racional Voisin, a viticultura, a permacultura, a ovinocultura, a aquaponia, a bioconstrução, a reciclagem,  as energias renováveis, o turismo sustentável e hospitalidade, e mais o que ocorrer - como diziam no Amapá. Ajudem!

Então, quando algo tiver que ser posto em prática, será a vez do pastor alemão aproveitar para trocar experiências sobre tudo que implique nos seus ofícios: pastor, artesão, marceneiro, construtor de fogões de queima eficiente, planejador de piscinas naturais, construções com terra, mini-cabanas, ferrocimento, telhados verdes, reciclagem de pallets, materiais alternativos, trilhas, fornos de barro e tandor. 

É inesgotável, vamos nos divertir muito tentando mudar o mundo!


Eu, uma roda reciclada, biochar , cerveja, costela e salsichão da Borrússia.
Agroburocrata, sitiante acidental ou pastor alemão?
Publique-se!

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Sitiante Acidental

Atenção!

O Pastor Alemão é um blog sobre a vida e pouco se falará da raça canina, menos ainda de assuntos religiosos.

Digo agora, para não repetir depois,  o nome do Blog se deve à condição humana do autor: com metade da origem familiar alemã é pastor de ovelhas na Borrússia, além de sitiante acidental e agroburocrata. 

Ao por todas as coisas junto, o conteúdo dos próximos posts abordará temas variados, mas não desconexos, com o propósito de compartilhar experiências, na esperança de que outro mundo seja possível; desejado justo, sustentável e absolutamente compartilhado por tod@s com equidade. 

E se der, também apre(e)nder com as contribuições, críticas e descobertas que venham de vocês, ai do outro lado dos clicks.

Por sinal, não deixe de comentar, curtir e compartilhar se for gostando, só para ver onde essa coisa toda vai chegar.


      

Blogue-se!